Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo
Câmara Reservada ao
Meio Ambiente
Apelação
0000520-64.2011.8.26.0457 – Voto 15404 – Pirassununga - Ra
APTE. : Baldin
Bioenergia S/A
APDO. : CETESB Companhia
Ambiental do Estado de São Paulo
MAGISTRADO DE
PRIMEIRO GRAU: Dr. Djalma Moreira Gomes Júnior
AÇÃO ANULATÓRIA DE MULTA. QUEIMA DE CANA-DE-AÇÚCAR.
Responsabilidade Objetiva. Teoria do risco. Aplicação do artigo 80, § 2º, do
Decreto 8.468/76. A apelante processou a cana-de-açúcar queimada,
aproveitando-se do produto da infração - RECURSO IMPROVIDO.
Trata-se de apelação interposta
contra sentença de fls. 175/180 que julgou improcedente ação anulatória de multa.
Inconformada, a autora pleiteia a
reforma dadecisão. Sustenta a inaplicabilidade da responsabilidade objetiva,
pois não concorreu, quer omissiva, quer comissivamente para a queima irregular e
não teve qualquer
Alega que é tão somente adquirente
da matéria-prima, por força contratual, não sendo responsável pela produção,
ausente o nexo causal. Aduz ainda que não é proprietária da área e que a conduta
de se beneficiar a que alude a Lei 997/76 pressupõe a prática de ilícito
pela apelante, o que não é o caso.
A CETESB apresentou as contrarrazões
(fls.194/209). A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo nãoprovimento do
apelo (fls. 219/227). Recurso regular e noprazo.
É O
RELATÓRIO.
Consta dos autos que a apelante foi
autuadapor agente da CETESB, AIIPM nº 43000629, sob a alegação de,em
10/07/2010, “ter se beneficiado da queima da palha decana-de-açúcar ocorrida
a menos de 15 metros da faixa de segurança da linha de
transmissão e de distribuição de energia elétrica, (...) causando incômodo
público poremissão de fumaça e fuligem”, infração enquadrada no artigo4º,
incisos III e V do Decreto Estadual nº 47.700 de
11/03/2003, combinado com os artigos
2º, 3º, inciso V e 26do Regulamento da Lei 997/76, aprovado pelo
Decreto8.468/76 e suas alterações (fls. 54/55).
Segundo consta do auto de inspeção de
fls.52/53, houve queima de palha de cana-de-açúcar em área derestrição, sendo
colhida e transportada para processamentona Baldin Bioenergia S/A.
A responsabilidade em questões
ambientais éobjetiva e baseia-se em
elementos concretos, presentes nocaso em tela, quais sejam a ocorrência
do dano e aatividade de risco desenvolvida pela apelante. Consoante a teoria do risco integral adotada, o
dano deve ser evitadopor aquele que pratica a atividade, sob pena
de responsabilização.
Além disso, a multa tem por base o
artigo
80, § 2º, do Decreto 8.468, cuja
previsão é: “responderápela infração quem de qualquer modo a cometer,
concorrerpara a sua prática ou dela se beneficiar”. Portanto, umavez que a
recorrente processou a cana-de-açúcar queimada,dela se beneficiou e está apta a
ser responsabilizada.
É inconteste o benefício auferido com
oprocessamento da cana, que constitui meio apto à produçãode açúcar, que é
vendido para a obtenção de lucro.
Ademais, a testemunha Ivaldo (fls.
171) afirmou que: “... Ainda não havia previsão de queimada paraa área em que
ocorreu o incêndio. Inobstante, a área foiplantada para ser colhida pelo
processo que necessita de
queimada...”. Logo, a apelante de
qualquer forma ia recebera cana-de-açúcar queimada em área de restrição,
fomentandoa ilegalidade da conduta.
No mais, pouco importa se a recorrente
eraou não proprietária da área, se participou do ato queoriginou a queimada ou
se a cana-de-açúcar estava pronta ounão para o corte, pois está sendo
responsabilizada por ter
se aproveitado do produto da
infração.Nesse sentido, já decidiu esta ColendaCâmara:
... A multa foi bem aplicada, portanto.
Resultou da expressa leitura do parágrafo
único do artigo 80 do Decreto 8.468/76:
responderá pela infração quem por qualquer
modo a cometer, concorrer para sua prática ou
dela se beneficiar. Inegável que em ao menos
uma das hipóteses legais a apelante se
inclui. Sua atividade é canavieira. Não nega
empregar o método rústico e nocivo. Ainda não
se adaptou à modernidade e não se apercebeu
que o etanol produzido de maneira
ambientalmente inadequada não terá vez no
mercado civilizado do Primeiro Mundo. E
mesmo que se fale em fogo acidental, ou se
argumente com a imputação do incêndio a
terceiros desconhecidos, ainda assim a
embargante haveria de ser responsabilizada.
O fato de não ter sido ela a autora da
queima -
o que não se comprovou - não a beneficia. É
que atendeu aos seus intuitos receber a
colheita da cana previamente submetida ao
tratamento rudimentar. A usina pode negar
ter sido a agente da queima ou ainda afirmar
que o incêndio foi criminoso. Só que ela não
receberia a cana se não houvesse uma conduta
ilícita por parte do fornecedor ou dos
supostos piromaníacos. Beneficiou-se da
atividade poluidora ao utilizar a cana como
matéria prima para a fabricação de seus
produtos, e por isso deve ser
responsabilizada pelos danos ambientais.
Ora, nada mais ilícito que receber matéria
prima obtida a expensas de um meio ambiente
sadio e
ecologicamente equilibrado, da saúde dos
membros da comunidade, e de práticas
agrícolas sustentáveis. Todo agente causador
de dano ecológico é responsável por suas
conseqüências. Está totalmente superada a
questão procedimental estéril de se eximir
alguém da responsabilidade, sob argumento de
que não foi o causador da queimada. A
jurisprudência segue o caminho mais sensato:
todo aquele que tirar proveito da conduta
lesiva, poderá ser chamado a responder por
ela. Parceiro, arrendatário, titular,
promitente comprador, meeiro, seja qual for
a natureza jurídica da avença ou a situação
que se pretenda fazer configurar, a resposta
do Estado-juiz deverá ser a mesma. Já não é
possível invocar descomprometimento para se
eximir de obrigações assumidas perante as
atuais e as futuras gerações. A
responsabilidade é solidária e objetiva.
Incide na espécie o velhíssimo brocardo
romano de que o ônus deve ser suportado por
quem se beneficia da prática. Todos os réus
devem responder pela nociva atuação em
relação à natureza. Importa considerar que o
fogo ocorreu em terreno de propriedade
destinada ao cultivo de cana-de-açúcar a ser
empregada na atividade da USINA SÃO LUIZ
S/A. Ao comprar a cana, colaborou com o
ilícito. Haveria se falar, no mínimo, em
culpa in eligendo da embargante, embora a
demonstração da culpabilidade, na hipótese
sub judice, seja desnecessária. (Apelação
Cível n° 9063539-69.2009.8.26.0000, Câmara
Reservada ao Meio Ambiente, Relator Des.
Renato Nalini, julgado em 31/03/2011).
Ante o exposto, nega-se PROVIMENTO ao
recurso.
RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO
Relator
Fonte: TJSP
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