Câmara Reservada ao
Meio Ambiente
Apelação 0002602-07.2009.8.26.0306 –
Voto 15501 – José Bonifácio - Ra
VOTO Nº: 15501
APTE. : JRC
APDO. : MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
MAGISTRADO DE
PRIMEIRO GRAU: Dr. Lucas Figueiredo Alves da
Silva
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. O
desconhecimento acerca da existência de APP não exime a responsabilidade do
proprietário em preservá-la. Obrigação de natureza real. Responsabilidade
objetiva. A r. sentença fixou medidas necessárias para garantir a
plena recomposição. NEGADO PROVIMENTO AO APELO.
Trata-se de apelação interposta
contrasentença de fls. 386/390 que julgou parcialmente procedenteação civil
pública.
Inconformado, o réu apela alegando que
nãodificultou a regeneração da área de preservação permanentee tampouco
provocou danos ambientais, o que afasta suaresponsabilidade civil. Aduz que é
pequeno produtor rural e
não tinha conhecimento do que era uma
APP e isolou eabandonou a área assim que soube da necessidade de preservação do
local.
Sustenta ainda que, consoante o laudo
defls. 315/330, é desnecessário o plantio de 4.250 mudas, e olaudo de fls.
357/360 constatou que a área foi recomposta,motivo pelo qual a ação devia ter
sido julgadaimprocedente. Subsidiariamente pleiteia a reforma dadecisão para
que venha a ser detalhada a forma de aguação,a quantidade de mudas a serem
plantadas e a forma decombate dos insetos.
O Ministério Público apresentou
ascontrarrazões (fls. 403/409). A Procuradoria Geral deJustiça opinou pelo não
provimento do recurso (fls.414/419). Recurso regular e no prazo.
É O RELATÓRIO.
De início observo que, culturalmente,
obrasileiro não está acostumado a utilizar a terra de modoútil, de molde a
implementar a função social constante doartigo 186, da Constituição Federal.
Assim, salvante situação de dano
anormal,fora do padrão, ou então, de flagrante má-fé, o Judiciáriodeve punir e
preservar o ambiente, mas também com olhospostos nos fins sociais e nas
exigências do bem comum, a
teor do artigo 5º, da LICC.
Dito isto, passo a análise da questão.
A r.sentença condenou ao cumprimento da obrigação de fazerconsistente em isolar
a área de preservação permanente noprazo de 30 dias e iniciar os procedimentos
mencionados nolaudo, na resposta do quesito nº seis de fls. 359, sob pena
de multa de R$ 500,00 (quinhentos
reais) por dia.
Por primeiro, restou inconteste nos
autos deque os fatos se deram em área de preservação permanente.
Odesconhecimento acerca da necessidade de preservação da APPnão elide a
responsabilidade do apelante, que deve utilizarsua propriedade conforme os fins
sociais.
Além disso, a responsabilidade,
conforme oprevisto no artigo 14, § 1º, da Lei 6.938/81, recepcionadopelo artigo
225 da Constituição Federal, é objetiva, ouseja, a propriedade obriga em termos
ambientais e aresponsabilidade não é subjetiva.
Mais ainda e coerente com isso, a área
depreservação permanente possui feição “propter rem”. Ter apropriedade ou posse
é o quanto basta. Inclusive, ajurisprudência evolui e se antes exigia o nexo
causal, aodepois passou a entender que a obrigação adere ao imóvel,bastando à
posse ou propriedade.
Nesse sentido, verificar:
“ADMINISTRATIVO -
DANO AO MEIO-AMBIENTE -
INDENIZAÇÃO
LEGITIMAÇÃO PASSIVA DO NOVO
ADQUIRENTE.
1. A responsabilidade
pela preservação e
recomposição do
meio-ambiente é objetiva,
mas se exige nexo de
causalidade entre a
atividade do
proprietário e o dano causado
(Lei 6.938/81).
2. Em se tratando de
reserva florestal, com
limitação imposta por
lei, o novo
proprietário, ao
adquirir a área, assume o
ônus de manter a preservação,
tornando-se
responsável pela
reposição, mesmo que não
tenha contribuído
para devastá-la.
3. Responsabilidade
que independe de culpa
ou nexo causal,
porque imposta por lei.
4. Recurso especial
provido.” (REsp n.
282.781/PR, rel. Min.
Eliana Calmon, j. em
16.04.2002).
O novo Código Florestal trouxe
previsão que
conduz a essa mesma conclusão, em seu
artigo 7º, § 2º,
prevendo que a obrigação de manutenção
da área de
preservação permanente tem natureza
real. E ainda,
consoante o § 1º do mesmo artigo, uma
vez ocorrida
supressão de vegetação em APP, o
proprietário, possuidor ou
ocupante a qualquer título é obrigado
a promover a
recomposição da vegetação.
A extensão da propriedade, consoante
acertidão da matrícula de fls. 64 e 223, é de 20,65hectares, com área total de
22,9 hectares. O perito nomeadopelo juízo constatou que a área gradeada
temaproximadamente 4,15 hectares (fls. 317), local ondeocorreu a degradação.
Esclareço que ao contratar serviço
para agradeação da área de preservação permanente (fls. 16),admitida tal
intervenção antrópica na contestação, oapelante degradou o local, impedindo a
regeneração natural.
Além disso, constatou-se que o local
estava sendo preparado
para o plantio de mudas de laranja
(fls. 17). Logo, não há
dúvidas da responsabilidade do
proprietário em promover a
recomposição, quer por ter contratado
serviço que culminou
em degradação, quer pelos dispositivos
legais jámencionados.
Os laudos produzidos em juízo foram
claros.
Tanto o laudo a fls. 314/330 quanto o
complementar de fls.
356/360 constataram que “a degradação
ocorrida pela
gradagem dentro e fora da APP está
sendo parcialmente
recuperada, por regeneração natural e
pelo plantio de 80
espécies florestais feito pela AES
Tietê”(fls. 358).
Em que pese a recomposição da área, em
parte
pelo plantio de mudas, em parte
naturalmente, o senhor
perito deixou claro, no item 6 do
laudo complementar (fls.
359) que as medidas tomadas até então
apenas iniciaram o
processo de recomposição, sendo
necessário que o
proprietário acompanhe o local e tome
medidas como aguação,
replantio de mudas, eliminação de
ervas concorrentes com as
árvores em crescimento e combate a
insetos predadores.
Assim, era de rigor a procedência da
açãonos termos da sentença, necessária a intervenção antrópicapara que a
recomposição se dê de forma integral.
O pedido subsidiário do apelante
também não merece acolhimento. Por primeiro, não houve determinação deplantio
de mudas, mas de replantio, isto é, eventuais mudas
que não se desenvolverem devem ser
replantadas. Em segundo,
os métodos para aguação e controle de
pragas e de ervas
daninhas devem ser definidos por
profissional da área.
Por fim, não houve irresignação no que
tangeao quantum da multa fixada, devendo a r. sentença impugnadadeve ser
integralmente mantida.
Considera-se prequestionada a
matériarelativa aos recursos especial e extraordinário.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao
recurso.
RUY ALBERTO LEME CAVALHEIRO
Relator
Fonte: TJSP
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